sábado, 9 de novembro de 2013

Autopsicografia 

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração

Pessoa, Fernando. Lírica e dramática, In: Obras de Fernando Pessoa 



No que se refere aos heterônimos, vejamos:

Alberto Caeiro 

É uma poesia aparentemente simples, mas que na verdade esconde uma imensa complexidade filosófica, a qual aborda a questão da percepção do mundo e da tendência do homem em transformar aquilo que vê em símbolos, sendo incapaz de compreender o seu verdadeiro significado.

A Criança 

A criança que pensa em fadas e acredita nas fadas
Age como um deus doente, mas como um deus.
Porque embora afirme que existe o que não existe
Sabe como é que as cousas existem, que é existindo,
Sabe que existir existe e não se explica,
Sabe que não há razão nenhuma para nada existir,
Sabe que ser é estar em um ponto
Só não sabe que o pensamento não é um ponto qualquer. 


Ricardo Reis 

O médico Ricardo Reis é o heterônimo “clássico” de Fernando Pessoa, pois observa-se em toda sua obra a influência dos clássicos gregos e latinos baseada na ideologia do “Carpe Diem”, diante da brevidade da vida e da necessidade de aproveitar o momento.

Anjos ou Deuses 

Anjos ou deuses, sempre nós tivemos,
A visão perturbada de que acima
De nos e compelindo-nos
Agem outras presenças.
Como acima dos gados que há nos campos
O nosso esforço, que eles não compreendem,
Os coage e obriga
E eles não nos percebem,
Nossa vontade e o nosso pensamento
São as mãos pelas quais outros nos guiam
Para onde eles querem E nós não desejamos.

Álvaro de Campos


Heterônimo futurista de Fernando Pessoa, também é conhecido pela expressão de uma angústia intensa, que sucedeu seu entusiasmo com as conquistas da modernidade.
Na fase amargurada, o poeta escreveu longos poemas em que revela um grande desencanto existencial. Como podemos observar:

Tabacaria 

Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada. (...).

sexta-feira, 4 de outubro de 2013

A Demanda do Santo Graal

Esta obra foi encontrada no livro Vespasiano de 1946 e considerada mística e simbólica. As ações escritas sucedem como no cinema e o leitor se deleita no prazer de saborear pouco a pouco o enredo, a trama, a narrativa e as ações das  personagens.  Há todo um clima  de  mistério   em relação  ao ambiente e à mística religiosa, tudo isso torna possível dinamizar as cenas, fugir da monotonia da narrativa.

C1-38.jpg image by KING_KONG_BOOKS

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Camilo Castelo Branco

CAMILO CASTELO BRANCO: AMOR DE PERDIÇÃO

Camilo Castelo Branco conquistou fama com a novela passional Amor de Perdição. Bem ao gosto romântico, a característica principal da novela passional é o seu tom trágico. As personagens estão sempre em luta contra terríveis obstáculos para alcançar a felicidade no amor. Normalmente, essa busca é frustrante. Mesmo quando os amantes ficam juntos, isso é conseguido a custa de muito sofrimento. Os direitos do coração, frequentemente, vão de encontro aos valores sociais e morais. Segundo o autor, Amor de Perdição foi escrito durante 15 dias, em 1861, quando ele estava preso na cadeia da Relação, na cidade do Porto, por ter-se envolvido em questões de adultério.

Como o drama de Romeu e Julieta, a obra focaliza dois apaixonados que têm como obstáculo para a realização amorosa a rivalidade entre as famílias. A ação se passa em Portugal, no século 19. O narrador diz contar fatos ocorridos com seu tio Simão. Residentes em Viseu, duas famílias nobres, os Albuquerques e os Botelhos, odeiam-se por causa de um litígio em que o corregedor Domingos Botelho deu ganho de causa contrário aos interesses dos primeiros. Simão é um dos cinco filhos do corregedor.

Devido ao seu temperamento explosivo, Simão envolve-se em confusões. Seu pai o manda estudar em Coimbra, mas ele se envolve em novas confusões e é preso. Liberto, volta para Viseu e se apaixona por Teresa Albuquerque, sua vizinha.

A partir daí, opera-se uma rápida transformação no rapaz. Simão se regenera, torna-se estudioso, passa a ter como valor maior o amor, e todos os seus princípios são dele decorrentes. Os pais descobrem o namoro.

O corregedor manda o filho para Coimbra. Para Teresa restam duas opções: casar-se com o primo Baltasar ou ir para o convento. Proibidos de se encontrar, os jovens trocam correspondência, ajudados por uma mendiga e por Mariana, filha do ferreiro João da Cruz. Mariana encarna o amor romântico abnegado.

Apaixona-se por Simão, embora saiba que esse amor jamais poderá ser correspondido, seja pelo fato de Teresa dominar o coração do rapaz seja pela diferença social: ela era de condição humilde, filha de um ferreiro. Mesmo assim, ama a ponto de encontrar felicidade na felicidade do amado.

Depois de ameaças e atentados, Teresa rejeita o casamento. Por isso será enviada para o convento de Monchique, no Porto. Simão resolve raptá-la, acaba por matar seu rival e se entrega à polícia. João da Cruz oferece-se para ajudá-lo a fugir, mas ele não aceita, pois é o típico herói romântico.

Matou por amor à Teresa, portanto assume seu ato e faz questão de pagar. Enquanto Simão vai para a cadeia, sua amada vai para o convento. Mariana, por sua vez, procura estar sempre ao lado de Simão, ajudando-o em todas as ocasiões. Condenado à forca, a sentença é comutada e Simão é degredado para a Índia.

Quando ele está partindo, Teresa, moribunda, pede que a coloquem no mirante do convento, para ver o navio que levará seu amado para longe. Após acenar dizendo adeus, morre. Seu amor exagerado a leva à perdição.

Durante a viagem, Mariana, que acompanha Simão, mostra-lhe a última carta de Teresa. Ele fica sabendo da sua morte, tem uma febre inexplicável e morre. Seu amor exagerado o leva à perdição. Na manhã seguinte, seu corpo é lançado ao mar. Mariana não suporta a perda e se joga ao mar, suicidando-se abraçada ao cadáver de Simão. Seu amor exagerado a leva à perdição.

Novela de Cavalaria

Tristão e Isolda

                          http://www.topofart.com/images/artists/Edmund_Blair_Leighton/paintings/blairleighton005.jpg


Tristão e Isolda são umas lendas medievais de origem céltica, que constitui uma das mais belas histórias de amor alguma vez concebidas. As primeiras versões escritas datam do século X. Os trovadores anglo-normandos de língua francesa e a rainha Leonor de Aquitânia contribuíram para a sua difusão na Europa.
Conta-se que Tristão ficou órfão, despojado injustamente da sua herança por vassalos de seu pai. Foi recolhido pelo tio, o rei Marco, da Cornualha, que o ajudou a tornar-se num cavaleiro da Távola Redonda. Tristão venceu a batalha contra o gigante Morolt, mas ficou gravemente ferido. Os seus ferimentos só poderiam ser curados pela magia da Rainha da Irlanda, grande inimiga do seu tio. Antes de se dirigir ao castelo da Rainha, Tristão disfarçou-se de músico, tomou o nome de Tãotris e tornou-se professor de música da princesa Isolda, a Loura . Tristão, já curado, matou um cruel dragão, em Weisefort, na Irlanda, e voltou para o castelo de seu tio Marco, a quem descreveu a beleza de Isolda com a qual o jovem tinha ficado impressionado.
O rei Marco ficou contente com as palavras do sobrinho, que o inspiraram a encontrar uma solução para acabar com a velha inimizade entre os dois reinos. Mandou, então, um emissário ao reino da Irlanda para que pedisse, em seu nome, a mão de Isolda. A Rainha da Irlanda concordou com o casamento e organizou um banquete. Para que nascesse uma paixão forte e duradoura entre Marco e Isolda, a Rainha mandou fabricar uma poção mágica do amor para lhes servir.
Durante o banquete, por descuido, os copos que tinham a poção mágica foram trocados e servidos a Tristão e Isolda, que se apaixonaram imediatamente. No entanto, a cerimónia do casamento entre Marco e Isolda prosseguiu. Tristão e Isolda, vivendo uma paixão incontrolável, decidiram encontrar-se às escondidas para viver o seu amor. Um dia, foram surpreendidos pelo rei Marco, que, magoado com a traição, os expulsou do castelo.
Os enamorados vaguearam durante muito tempo, sem qualquer ajuda, até que chegaram a um ponto de grande pobreza e debilidade física. Compadecido, Marco recolheu Isolda no castelo e enviou Tristão para bem longe, em França, onde este chegou a casar-se com uma outra jovem, filha do Duque da Bretanha, também chamada Isolda. A jovem, que era conhecida como Isolda, a das Mãos Brancas , nunca conseguiu ver retribuído o amor que sentia por Tristão e este nunca consumou o casamento, dado que continuava fiel ao seu primeiro amor. Passado algum tempo, Tristão ficou ferido noutra batalha e pediu à sua amada Isolda, a Loura , que tinha herdado os dotes mágicos de cura da Rainha da Irlanda, que viesse socorrê-lo. Combinaram então que, se o navio, que tinha enviado com o emissário, voltasse com velas brancas, a resposta de Isolda, a Loura , seria afirmativa; mas, se as velas fossem negras, ela não poderia vir. Isolda, a das Mãos Brancas , com ciúmes, resolveu vingar-se da indiferença do marido, dizendo-lhe que o navio tinha chegado com as velas negras porque Isolda tinha falecido durante a viagem. Tristão não suportou a perda de Isolda e morreu de desgosto. Quando Isolda, a Loura , encontrou Tristão sem vida, sentiu uma grande dor e morreu também de desgosto, abraçada ao corpo de Tristão. Foram enterrados lado a lado. Diz a lenda que das sepulturas nasceram duas árvores que cresceram entrelaçadas para que nunca fossem separadas.

Tristão e Isolda é também um drama lírico em três actos, com texto e música da autoria do compositor alemão Richard Wagner (1813-1883), publicado em 1865. O assunto é o da lenda medieval, acima referida. A música obedece a uma estrutura surpreendente que, através de um cromatismo muito vincado, dá expressão admirável à paixão, à ternura e à dor, sentimentos que dominam o desenrolar da acção.

sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Carta de Guia de Casados

Dom Francisco Manuel de 

Melo




Ao longo da leitura da Carta, escrita por Dom Francisco, é possível extrair os seguintes conselhos aos homens em relação a suas esposas:

Dos negócios

"Nos cuidados e empregos dos homens, não se metam as mulheres (...)
a mulher sisuda deixe de dar a seu marido modestamente o seu parecer..."


Dos trajes e oficios da Mulher:

"Sirva a mulher de senhora de sua casa, satisfaça as obrigações deste oficio: que assaz fará de serviços, a sua casa, a seu marido, se o fizer como deve."

"Ande a mulher toda vestida, e sempre composta por sua casa, e jamais a vejam seus criados em habito indecente."









Camilo Castelo Branco

Escritor português


Camilo Castelo Branco (1825-1890) foi um escritor português. "Amor de Perdição" foi sua novela mais importante. Foi considerado o criador da novela passional portuguesa. Viveu uma vida agitada e teve vários casos amorosos que provocaram escândalos. Escreveu irreverentes crônicas para jornais. Ingressou na Escola de Medicina na cidade do Porto, mas não concluiu o curso. Dedicou-se à atividade literária, vivendo exclusivamente de seus trabalhos. Recebeu o título de Visconde concedido pelo rei de Portugal, D. Luis I.
Camilo Castelo Branco (1825-1890) nasceu no dia 16 de março, na freguesia dos Mártires, em Lisboa, Portugal. Filho de Manuel Joaquim Botelho Castelo Branco e de Jacinta Rosa do Espírito Santo Ferreira. Ficou órfão de mãe com um ano e de pai com 10 anos. Foi morar com uma tia e depois com sua irmã mais velha. Em 1841, com apenas 16 anos, casou-se com uma jovem de 14 anos, Joaquina Pereira, mas logo deixa a mulher.
Em 1843 ingressou na Escola Médico-Cirúrgica na cidade do Porto, mas não conclui o curso. Em 1845 publicou seus primeiros trabalhos literários. Em 1846 fugiu com a jovem Patrícia Emília, mas a abandonou poucos anos depois. No ano seguinte morreu sua esposa legítima, de quem estava separado, e a filha do casal morreu no ano seguinte.
Camilo Castelo Branco passou por uma crise espiritual em 1850, e ingressou no seminário do Porto, pretendendo seguir a vida religiosa. Nesse ano conheceu Ana Plácido que casada com um comerciante, abandonou o marido em 1859 e foi viver com Camilo. Em 1860 é processado e preso por crime de adultério, mas é absolvido no ano seguinte, passando a viver com Ana. O casal foi morar em Lisboa e depois em São Miguel de Seide, sempre com muitos problemas financeiros.
Em 1863 publica Amor de Perdição, sua novela mais famosa. Sua vida atribulada lhe deu inspiração para os temas de suas novelas. Camilo Castelo Branco também reconstituiu em suas obras o panorama dos costumes de Portugal de seu tempo, quase sempre com uma profunda sintonia com as maneiras de ser e sentir do povo português. Em 1889 quando se torna uma celebridade nacional como escritor, recebe uma homenagem da Academia de Lisboa.
Obras
Mistérios de Lisboa (1854), Duas épocas na vida (1854), O livro negro do padre Dinis (1855), Vingança (1858), Carlota Ângela (1858), A morta (1860), O romance de um homem rico (1861), Amor de perdição (1862), Amor de salvação (1864), O olho de vidro (1866), O retrato de Ricardina (1868), A mulher fatal (1870), Doze casamentos felizes (1861), Estrelas funestas (1861), Estrelas propícias (1863), Coração, cabeça e estômago (1862).
Uma doença nos olhos que pouco a pouco lhe tirava a visão, fez Camilo mergulhar em profunda depressão. Depois de saber que ficaria definitivamente cego, Camilo suicidou-se em São Miguel de Seide, Vila Nova de Famalicão, no dia 1 de junho de 1890.


“Viram-na, um momento, bracejar, não para resistir à morte, mas para abraçar-se ao cadáver de Simão, que uma onda lhe atirou aos braços.  O comandante olhou para o sítio donde Mariana se atirara, e viu, enleado no cordame, o avental, e à flor da água, um rolo de papéis, que os marujos recolheram na lancha.”

(extraído do último capítulo de “Amor de Perdição”)

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

                                                   


         Trovadorismo


              Novelas de cavalaria

      As novelas de cavalaria, surgidas durante o trovadorismo, são narrativas ficcionais de acontecimentos históricos, relatos de combate e aventuras de cavalheiros medievais enfrentando provações físicas e morais em nome da honra e do e do amor.
            Com o advento humanismo, surge um novo ciclo, desvinculando dos ideais religiosos cristão e erotização das relações  amorosas. Inicia se com a novela Amadis de Gaula (1508),de autor desconhecido, que foi reeditada e continuada ao longo do séc. VXl formando o ciclo de Amadises, que gerou dos livros todos em castelhano.

Novela de Cavalaria - Amadis de Gaula

Amadis de Gaula se transformou num dos mais célebres romances de cavalaria em circulação na Europa Medieval. A autoria da obra é reclamada por portugueses, espanhóis e até mesmo, por franceses.
Na versão espanhola de Garcí Rodríguez de Montalbo, Amadis é fruto dos amores clandestinos de Elisena, filha de Garínter, rei da Pequena Bretanha e do rei D. Perion de Gaula, que o abandonam em uma pequena arca nas águas do mar. Salvo por uma família que não lhe sabe a origem, com apenas sete anos de idade é escolhido para pajem de Oriana filha do Rei D. Lisuarte da Grã-Bretanha. A rainha é quem o apresenta a Oriana, com estas palavras: “Amiga, este é o pajem que voz servirá". Amadis guarda tais palavras no coração e enamora-se de Oriana e desde aí a sua vida desdobra-se num longo serviço inteiramente consagrado à amada. Tímido, durante muito tempo não revela seu amor. Amadis foi criado pelo cavaleiro Gandales que o leva a meter-se em fantásticas aventuras, sempre protegido pela feiticeira Urganda, e perseguido pelo mago Arcalaus, o encantador. Atravessa o arco encantado dos leais amadores no centro da Ilha Firme, luta contra o terrível monstro Endriago, matando-o. Passa por todo o tipo de perigosas aventuras, pelo amor, oculto da sua amada, Oriana.
A história acaba com o Rei Lisuarte, mal aconselhado por conselheiros invejosos, a afastar Amadis de sua amada e a tentar casar Oriana com um inimigo do herói. O Amadis resgata Oriana e leva-a para a Ilha Firme. Lisuarte, aliado a Galaor (ciumento de Amadis) e a Esplandian, declara guerra a Amadis. Através de várias batalhas, Amadis enfrenta Galaor, até que o mata. Lisuarte também é morto por Amadis em combate. Num terceiro, o herói enfrenta Esplandian, sendo que desta vez é Amadis que é morto. Oriana que, de uma janela, observa o combate, ao ver a morte de Amadis, atira-se dali para o solo e morre.

Para quem tiver interesse em ler mais sobre " Amadis e Gaula" , pode ler uma tradução feita por Graça Videira Lopes, da Universidade Nova de Lisboa, a partir do original castelhano de Garcí Rodríguez de Montalvo,  se encontra aqui em PDF.

Sobre as Novelas de Cavalaria


Nem só de poesia viveu o Trovadorismo, mas também floresceu nesse período um tipo de prosa ficcional, as chamadas "Novelas de Cavalaria", embora a maioria das novelas de cavalaria em língua portuguesa são traduções ou adaptações de novelas francesas ou inglesas. Elas continham narrativas de assuntos de guerra, e ressaltava a figura dos "heróis-cavaleiros" que passavam por situações perigosíssimas para defender o bem e vencer o mal.
Esses cavaleiros medievais eram idealizados na figura de homens castos, fieis, dedicados, e sempre dispostos a qualquer sacrifício para defender a honra cristã, ou seja, de acordo com os ideais da Igreja Católica, por quem lutavam. Eles eram diretamente ligados as cruzadas e estavam envolvidos na luta em defesa da Europa Ocidental contra sarracenos, eslavos, magiares e dinamarqueses, considerados como "inimigos da cristandade". 
As novelas de cavalaria se dividem em três ciclos: 
1. O Ciclo Clássico - Narrativas baseadas na história e lendas de clássicos antigos, incluindo as façanhas de Alexandre, o Grande e dos heróis da Guerra de Tróia.
2. Ciclo Carolíngio ou Francês - Romances que tem por herói Carlos Magno e seus cavaleiros.
3. O Ciclo Bretão ou Arturiano - assuntos de origem Celta, especialmente centrados na corte do Rei Arthur e de seus célebres cavaleiros da távola redonda. 



Geralmente, as novelas de cavalaria não apresentam uma autoria. Elas circulavam pela Europa como verdadeira propaganda das Cruzadas, para estimular a fé cristã e angariar o apoio das populações ao movimento. As novelas eram tidas em alto apreço e foi muito grande a sua influência sobre os hábitos e os costumes da população da época. 

As novelas Amadis de Gaula e A Demanda do Santo Graal foram as mais populares entre os portugueses.


Novela de Cavalaria - João de Barros e a Crônica do Imperador Clarimundo

A narrativa cavaleiresca. 

João de Barros e a Crônica do Imperador Clarimundo.


Nascido do casamento de Adriano, rei da Hungria, com a filha do rei de França, “Clarimundo” é tirado aos pais pelas intrigas de uma ama. Abandonado junto duma fonte, é recolhido por Grionesa, nobre viúva italiana, e educado por esta como filho. Ainda muito jovem pede e consegue ser armado cavaleiro pelo rei de França, que ignora ter diante de si o próprio filho. Iniciam-se, neste ponto, as maravilhosas aventuras e as muitas peregrinações do herói que é, entretanto, reconhecido pela mãe, acabando depois por encontrar ‘Clarinda’, a mulher da sua vida, filha de Apolinário, imperador de Constantinopla.
A relação amorosa segue os esquemas clássicos do género: é um sentimento sublime que consegue superar os obstáculos e dificuldades de toda a espécie e que será coroado pelo matrimónio, primeiro consumado em segredo, depois realizado oficialmente, após “Clarimundo”, com outros cavaleiros, ter derrotado as forças do Grão-Turco que haviam chegado a ameaçar as muralhas de Constantinopla.
No contexto destas aventuras deve ser referida aquela que, com todo o direito, pode ser considerada a mais importante do romance, visto que constitui o verdadeiro objectivo da sua composição.
No capítulo IV do terceiro e último livro encontramos “Clarimundo” em Portugal, na companhia do mago “Fanimor”, desde sempre o seu protector oculto. Este condu-lo ao alto da torre de Sintra e aqui, tomado pelo espírito profético, descreve-lhe em versos a sua gloriosa descendência: dele procederão os reis de Portugal que estenderão o seu domínio desde as regiões orientais extremas até às mais ocidentais.
A profecia de “Fanimor” ocupa no seu conjunto 41 oitavas e uma quadra em versos de ‘arte maior’, mas por si só confere um sentido novo a todo o romance. “Clarimundo” não é, ou não é mais, um dos muitos heróis dos romances de cavalaria; a sua função não se resolve simplesmente ao nível pedagógico exemplar, já que a sua acção, o seu heroísmo e a sua “corteisie”,recebem também um superior crisma épico.


Poema à boca fechada - José Saramago

Poema à boca fechada
José Saramago

Não direi:
Que o silêncio me sufoca e amordaça.
Calado estou, calado ficarei, 
Pois que a língua que falo é de outra raça. 


Palavras consumidas se acumulam, 
Se represam, cisterna de águas mortas, 
Ácidas mágoas em limos transformadas, 
Vaza de fundo em que há raízes tortas. 


Não direi: 
Que nem sequer o esforço de as dizer merecem, 
Palavras que não digam quanto sei 
Neste retiro em que me não conhecem. 


Nem só lodos se arrastam, nem só lamas, 
Nem só animais bóiam, mortos, medos, 
Túrgidos frutos em cachos se entrelaçam 
No negro poço de onde sobem dedos. 

Só direi, 
Crispadamente recolhido e mudo, 
Que quem se cala quando me calei 
Não poderá morrer sem dizer tudo.


Novelas de cavalaria - BRUMAS DE AVALON

ANÁLISE CRÍTICA DO FILME AS BRUMAS DE AVALON


ANÁLISE CRÍTICA DO FILME “AS BRUMAS DE AVALON”[1]
Hernani Gomes Farias da Silva Júnior[2]
Hindemburg Henrique Tamiarana2
Shéllida de Araújo Dias2


Sinopse do Filme: O filme “As Brumas de Avalon” é uma adaptação da obra homônima de Marion Zimmer Bradley que foi escrita em quatro volumes. A história se passa por volta do século V e tem por objetivo narrar a já conhecida lenda do Rei Arthur e seus cavaleiros a partir de uma perspectiva feminina, o que acaba resultando em uma reelaboração do universo mítico da trama. 
Direção: Uli Edel


Ficção que mostra um intenso conflito existencial por parte dos personagens, “As Brumas de Avalon” é um filme que narra o avanço do cristianismo (que estava começando a ganhar terreno) e o início da extinção do paganismo. Nesse cenário, há um temor, por parte dos que cultuavam a velha tradição, de que houvesse o desaparecimento do templo sagrado de Avalon - única possibilidade de levar à frente a linhagem da Deusa.
Morgana, protagonista e narradora da história, vive um forte drama que, muitas vezes, se confunde com sua própria vontade: ora percebe-se em um universo fantástico de magia do qual a sua essência faz parte, ora sua mente é composta pelos costumes cristãos que começam a imperar. Nesse contexto, surge Arthur como um grande guerreiro pois, segundo as palavras de Morgana, “se um grande líder não unisse cristãos e os seguidores da Deusa, a Bretanha estaria condenada ao barbarismo e Avalon iria desaparecer”.
Arthur e Morgana foram levados de sua mãe ainda crianças: ele seria treinado, por Merlin, para ser um grande guerreiro e ela, (treinada por Viviane) para ser a substituta da Grande-Sacerdotisa de Avalon. Os dois cresceram e se encontraram no ritual de Beltame. Ali, tiveram uma relação sexual sem saber que eram irmãos (pois os dois estavam mascarados para esconder a sua verdadeira identidade). Isso os tornariam iniciados na tradição. Como resultado dessa copulação, nasce Mordred.
Mordred, filho de Morgana e de seu meio irmão Arthur, poderia resgatar a paz do sul da Grã-Bretanha e unir as tradições religiosas. Esse era o propósito de Viviane, quando decidiu que Morgana deveria dar à luz um filho de Arthur, que teria a mesma linhagem da Grande Deusa, pela forte união do sangue de dois grandes guardiões. Mas Mordred, influenciado por Morgause, se rebela contra o próprio pai – o rei Arthur.
Infelizmente, a trama termina em tragédia: o filho (Mordred) mata o pai (Arthur) e vice-versa.
Quando Morgana levou Arthur, ferido, até Avalon, para que ele sobrevivesse, percebeu que aquele templo já havia desaparecido; entretanto, sempre esteve presente em seu coração, mesmo naquele momento em que  ele se fechava para ela: “Embora Avalon tivesse me rejeitado, senti seu poder quando o rei e eu chegamos às margens sagradas. Comecei a duvidar que chegaria a Avalon. Talvez, pela desobediência, ficaríamos perdidos nas brumas. Ou talvez, com a morte de Viviane, ele tivesse desaparecido”.
Com a morte de Arthur e o avanço do Cristianismo, a antiga religião da Deusa foi substituída e, como consequência, os fieis cristãos adaptaram a figura da Deusa pagã à figura da Virgem Maria, mãe de Jesus Cristo. Segundo Morgana, “Avalon desapareceu do mundo dos homens e apenas Glastonbury (templo cristão) marca o local onde ele esteve. Os saxões se espalharam pela Bretanha e a tornaram sua e a Deusa foi esquecida. Ou assim pensei por muitos anos. Até perceber que a Deusa havia sobrevivido. Ela não foi destruída, apenas adotou outra encarnação. E talvez um dia as gerações futuras poderão fazer com que volte a ser como a conhecíamos na glória de Avalon”.
Um dos aspectos mais chamativos em “A Brumas de Avalon” é o Culto da Grande Deusa. Segundo pesquisadores, esse culto teve seu início nos primórdios da humanidade, quando os primeiros homens cultuavam a Deusa Gaia, que era representada pela natureza.
Durante o período Neolítico, a mulher tinha um papel de prestígio - ela era a “representação” da Deusa Gaia, pois possuía o poder de gerar vida.
O culto da Terra Mãe evoluiu para o culto da Deusa Mãe por volta de 4000 a.C, tendo a Deusa Mãe continuado a ser vista como símbolo de fecundidade, de fertilidade.
A Deusa Mãe, durante muito tempo reinou sozinha, única, mas passados os anos, ela recebeu várias funções e foi associada com um jovem deus que assumiu o papel de Filho Amante. Foi a partir dessa associação que, em algumas culturas, originou-se o ritual do hieròs - gamos ou casamento sagrado.
As representações terrenas do hieròs - gamos recebiam o nome de “prostituição sagrada” - costume que consistia em um ritual onde toda jovem púbere oferecia à Deusa sua virgindade: “Como prostituta, sentava – se à espera de um estranho que lhe fizesse uma oferenda em dinheiro e, fosse qual fosse a quantia, ela aceitava, cumprindo o sagrado ritual do amor. Só após essa oferenda à Deusa a jovem era considerada virgem...” (BARROS, 2004: 29).
Esse ritual pode ser verificado, no filme em análise, na cena em que Morgana consuma uma relação sexual com Arthur durante a festividade de Beltame. Na História, por sua vez, podemos ver que o hieròs - gamos teve não só teve um sentido religioso, mas também político.
O enredo do filme em análise apresenta, também, vasta simbologia. Exemplifiquemos com:

1. As brumasque representam um período de incerteza bem perceptível na metáfora alegorizada do título, onde há a sugestão de um período de transição do paganismo para o Cristianismo; do fim de uma cultura matriarcal e o surgimento do patriarcalismo.
2. A Festa de Beltameritual pagão em comemoração ao fim do inverno. Ocorria no 1º dia de verão, mas agraciava, também, a chegada da primavera. Era conhecido como “Ritual de Fertilidade”.
3. luasímbolo do feminino. Sua fase minguante representa o poder da mulher.

Enfim, o  filme “As  Brumas  de  Avalon”  é  emocionante  e  recomendado  para aqueles que desejam saber mais sobre o ciclo bretão e/ou a história da mulher.


REFERÊNCIAS:
BARROS, Maria Nazareth Alvim de. As Deusas, as Bruxas e a Igreja: Séculos de Perseguição. RJ: Rosa dos Tempos, 2004.

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

Novelas de Cavalaria - Fragmento A Demanda do Santo Graal


Dês i ferirom-na no braço destro de ũũ ferro qual convém a aquel mester e o sangue começou a sair e ela se sinou e comendou-se a Nosso Senhor. E depois disse aa dona:
- Eu som morta por guarecerdes vós. Por Deus rogade por minha alma.
E depois que a escudela foi chea de sangue esmoreceu ela e os III cavaleiros forom-lhe ao braço e estancarom-lhe o sangue e çarraron-lhe a ferida. E depois jouve gram peça esmorecida e acordou e disse:
- Irmão Persival, eu moiro por saúde desta dona. (Nunes, 1995:329)

Neste fragmento do texto nota-se  o sacrifício da donzela com a aproximação da figura de Cristo. O sangue, símbolo da redenção cristã, é altamente explorado nesse episódio.                
A aproximação com o sacrifício de Cristo estende-se até a frase que evoca o perdão divino e exalta a piedade em relação aos opressores. O sacrifício da irmã de Persival e o derramamento de seu sangue curam a mulher leprosa e também permite que os três cavaleiros, presos no castelo, prossigam suas “aventuras” em busca do santo Graal. A aparente fragilidade da jovem em relação aos fortes cavaleiros também remete a Cristo, que como um cordeiro sacrifical admite em si o sacrifício em favor de outros.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Coroação póstuma de Inês de Castro

Achei interessante compartilhar com vocês essa imagem. É de um quadro, pintado por Pierre-Charles Comte (1823-1895), que retrata a coroação póstuma de Inês de Castro, assunto abordado pela professora Célia em nossa última aula.

Está Criado!

Caros colegas da poderosa turma B de Letras da Faculdade Vargem Grande Paulista,

Conforme o combinado em sala de aula, aqui está o nosso blog!

O objetivo dele é compartilharmos conteúdos relacionados a Literatura Portuguesa, conforme o que estudaremos este semestre com a professora Célia Lara.
Aos poucos estou adicionando todos, através de seus e-mails, como autores no blog. Assim, vocês poderão participar de duas maneiras: publicando e comentando publicações de outros colegas. Tenho certeza que em breve contaremos com um conteúdo muito rico aqui.
Estarei administrando, porém aceito sugestões de todos para melhorias, afinal, o blog é nosso!

Então, vamos lá!
Vamos encher esse blog com o conhecimento que adquirirmos!
Ficaremos "craques" em Literatura Portuguesa!
Mãos à obra!